segunda-feira, 24 de março de 2014


Grutas da Arrábida - Patrimónios que se Revelam
  A Serra da Arrábida não é propriamente uma região de grandes grutas, mas é sim uma região onde as grutas têm características de rara beleza e valor patrimonial. Ao Longo do tempo geológico, no silêncio e na imensidão da escuridão, na maior parte das suas grutas, as salas e galerias foram sendo recobertas e adornadas por formações estalagmíticas de rara beleza, e o resultado foi magnífico.
 
Gruta do Frade
 
 Mas, antes de qualquer desafio de aventura, de coragem ou de atrevimento para lhe aceder, é embrenhando-nos neste universo que verdadeiramente os nossos sentidos despertam. Por ser imensa a paisagem cavernícola da Arrábida, esta faz-nos sentir pequenos em relação ao espaço e ao tempo. Sentimos que aqui a nossa presença não passa de um mero momento, um abrir e fechar de olhos e já tudo passou. Esta paisagem, janela para o passado de momentos da história natural da região, conta-nos uma história que apenas começou e que jamais será terminada.
 
Gruta da Grande Falha
 
Estes mundos, museus da profundidade do tempo, presenciaram a chegada das primeiras comunidades humanas a este território, ainda em pleno período glaciar. O homem rapidamente se deu conta da utilização das grutas para se abrigar e proteger de outros animais, ou, presumivelmente, para realizar as suas experiências mágico-religiosas.
 
Por motivos ainda mal conhecidos, depois da chegada destes primeiros povoadores, há mais de 30 000 anos, seguiu-se um período em que aparentemente as grutas não conservaram testemunhos de actividade humana. 
 
Só mais tarde, há cerca de 7000 anos, com as primeiras comunidades de agricultores-pastores, voltamos a ter a utilização documentada das grutas. Nesta época, as populações vêm as grutas como espaço de repouso final para alguns dos seus entes queridos, existindo, inegavelmente, uma relação simbólica entre as cavidades e as crenças funerárias.
 
É a partir destas comunidades que as grutas registam uma utilização mais regular, atingindo há cerca de 4000 anos, no período da Idade do Bronze, talvez, a sua maior intensidade.
 
As comunidades da Idade do Bronze vão continuar a olhar para as grutas como espaços rituais, sendo que neste caso deixaram artefactos num longo conjunto de cavidades que parece acompanhar a linha de costa, desde a gruta mais a Ocidente, no Cabo Espichel, até à parte Oriental, no Portinho da Arrábida.
 
No final da Idade do Bronze e inícios da Idade do Ferro (séc. XI-X a.C. em torno de 1000 a.C.), as populações persistiram na utilização das grutas, tendo deixado vestígios em várias cavidades.
 
Lapa da Cova
 
Dos Fenícios, há cerca de 3000 anos, está muito bem documentada a utilização da Lapa da Cova como santuário, onde foram deixados muitos artefactos.


No período romano, há cerca de 2000 anos, a utilização das grutas está mal documentada. Esta utilização efectivou-se, talvez, como abrigos, ou numa situação muito pontual.
 
Os séculos VI-VIII parecem trazer para algumas grutas da Arrábida monges anacoretas cristãos, na sua necessidade de fugir ao mundo e se aproximarem de Deus. A sua presença está bem documentada em algumas grutas do Vale das Lapas.
 
Na época Islâmica as pequenas cavidades continuaram a acolher monges muçulmanos, casos das grutas do Vale das Lapas, onde deve ter existido uma madrasa (tipo de escola), dado que na Lapa 4 de Maio foi descoberta e identificada uma tábua de madeira com um excerto da surha (texto religioso) 39 do Corão.

Lapa 4 de Maio (tábua árabe)
 
Depois da época Islâmica há a utilização das grutas por pastores, como abrigos para si e para os seus animais, tendência seguida até aos dias de hoje.
 
Nesta zona serrana, o Património subterrâneo assume características singulares no panorama nacional. Possui testemunhos magnificamente preservados; de paleo-níveis de mar (praias elevadas), de fauna, de beleza litológica e de uma contínua ocupação humana.
 
A Arrábida na sua integridade, e do ponto de vista cultural e etnográfico, pode bem assumir a metáfora de “terras do princípio do Mundo”, espelham-se neste Museu da Profundidade do Tempo que são as suas Grutas e todo o seu Património Subterrâneo.

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